Vaidade infantil: até que ponto é saudável?

Na escola, a criança não quer brincar de massinha porque não quer estragar o esmalte. Outra não quer ir à natação porque o cabelo fica despenteado e aí não dá para fazer escola. Algumas meninas deixam de fazer a atividade física porque não querem estragar a roupa ou porque querem ainda fazer a atividade física de salto alto. Crianças muito vaidosas: qual o limite? Esse tipo de comportamento é prejudicial? Qual a responsabilidade dos pais nisso?

Para Caio Feijó, mestre em Psicologia da Infância e da Adolescência, maquiagens pesadas, cílios postiços, batom vermelho, peruca, roupas extravagantes ou sensuais, salto alto, adereços exagerados, por exemplo, são componentes de uma fase absurdamente extrapolada do que se pode chamar vaidade. A responsabilidade, defende o educador, é dos pais porque a vaidade infantil é, obviamente, aprendida na infância.

“Nessa fase da vida a criança tem como modelo principalmente as pessoas com quem ela convive e, na primeira infância (até os 6 anos), elas convivem essencialmente com os pais. Assim, podemos concluir que, salvo raras exceções, a maioria das crianças vaidosas aprendeu esse comportamento com seus pais em casa ou com seus principais cuidadores na ausência dos pais”, avalia Caio, autor de livros sobre o tema como “Pais competentes, filhos brilhantes”, “Preparando alunos para a vida” e “Os 10 erros que os pais cometem”.

Para a psicóloga e doutora em psicanálise pela USP, Priscila Gasparini, geralmente os pais que demonstram muita vaidade são aqueles que cultuam bastante o corpo, que vivem na academia e fazendo dieta, que fazem muitas cirurgias plásticas. Esses pais transmitem, ainda que de uma maneira inconsciente, esse culto ao corpo para as próprias crianças.

“O que a criança entende? Minha mãe é magra, ela vive fazendo dieta, ela só gosta de gente magra, logo, eu tenho que ser magra para ser aceita. Tudo isso fica gravado e é prejudicialpara acriança. Os pais devem incentivar a criança a ser como ela é e a passar as fases da infância que são muito importantes. Pular fases pode estimular fases erradas”, defende Priscila Gasparini.Quandoessa vaidade infantilé saudável?

Higiene, bons modos, roupa limpa e umapostura social correta é uma forma de vaidade saudável que deve ser incentivada pelos pais. “Praticar e ensinar ‘valores’ aos filhos é um hábito que, por si só, já traz a consciência da importância em ‘ser’. Incentivar a boa higiene e responsabilidade são obrigações dos pais no que se refere à boa educação. Uma criança bem educada não precisa de vaidade para se destacar”, observa Caio Feijó.

E quandoa vaidade infantilpassa do limite?

A vaidade normal, explica Priscila, é as crianças imitarem os pais e isso é um processo saudável de identificação. É normal a menina usar sapato alto, maquiagem, querer arrumar o cabelo e unhas, e é normal os meninos quererem imitar os pais, fazer a barba, treinar musculação, brincar de dirigir o carro, por exemplo. Mas quando essa vaidade se torna prejudicial?

“É prejudicial quando deixa de ser uma brincadeira, quando começa a estimular a sexualidade da criança e quando começa a virar um culto à beleza. Os pais devem estar bem próximos disso para avaliar essa situação e dar limites a essas vaidades. A criança pode ir arrumadinha a um casamento, com uma maquiagem leve no dia de uma festa, mas isso deve serentendido como uma brincadeira esporádica e não inserir isso no dia a dia da criança como uma atividade do cotidiano dela”, opina a psicóloga.

Para Caio Feijó, a vaidade infantil se torna prejudicial principalmente quando a criança é exposta ao ridículo e não tem noção disso, assim como os pais. “No que se refere a exposições sensuais de meninas (uso de salto alto, maquiagem, roupas justas e transparentes) que muitos pais acham ‘lindinha’, segundo estudos científicos, é um dos estímulos mais excitantes para os pedófilos”, alerta o educador. E a escola tem responsabilidade?

O ambiente escolartambém pode ser um ambiente propenso a fornecer modelos de comportamentos recompensados que tem ampla possibilidade de serem imitados. Caio conta um exemplo para ilustrar esse tipo de comportamento. Certa vez, num colégio estadual, ele foi abordado por uma professora de ensino médio que relatou que, na sala dela, composta por 35 alunos, tinha 17 eram meninas e seis estavam grávidas.

Na entrevista com as garotas, o psicólogo descobriu a causa: uma delas, com poder de liderança entre as demais, certo dia apareceu na escola contando que havia engravidado. Perguntando sobre a causa, ela respondeu: “eu decidi, escolhi o garoto, transamos e eu terei um filho de forma independente, simplesmente porque eu quero ter um filho”.

“Pronto: bastou essa atitude, avaliada como gratificante pelas amigas, para que as outras cinco também imitassem esse comportamento. É mais ou menos isso que acontece com a questão da vaidade como maquiagem, escova de cabelo, tinturas, roupas, entre outros produtos. Basta uma criança ouvir um comentário de que a fulana é linda ou está charmosa que tenderá a imitá-la para obter os mesmos elogios”, explica Caio.

Fases da infância são importantes

Para a psicóloga Priscila Gasparini, as crianças têm que vivenciar as fases da infância porque o culto à beleza é prejudicial e a criança acaba trazendo esse conteúdo para a vida dela e deixando de brincar. “Por isso, os brinquedos nunca podem perder espaço para a vaidade”, defende a psicóloga. O problema de uma criança achar que a vaidade é essencial, explicaa psicopedagoga Elisabete da Silva Duarte,é que age e pensa como um adulto sem ter ainda a idade para isso. “Essa postura faz com que elaperca situações de descobertas do próprio mundo enão se sente à vontade com a idade que tem. E, em algumas situações extremas, não se enturma com facilidade”, explica a psicopedagoga.

A educadora Maria Edna Scorcia, diretora pedagógica do Colégio Joana D’Arc, recomenda quepais e mães devem permitir e incentivar que as crianças sejam crianças. “Deve-se estimular o lado infantil, os pais devem passear no parque, brincar com os filhos e assim elas vão reconhecer que são crianças e não vão se comportar diferente. Enquanto elas se reconhecerem como criança essa vaidade não vai passar do limite do bom senso”, aconselha Edna.

 

Fonte: https://www.msn.com/pt-br/noticias/other/vaidade-infantil-at%C3%A9-que-ponto-%C3%A9-saud%C3%A1vel/ar-AA5akVm